24 novembro, 2006

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Sou uma devastação inteligente.
Com malmequeres fabulosos.
Ouro por cima.
A madrugada ou a noite triste tocadas
em trompete. Sou
alguma coisa audível, sensível.
Um movimento.
Cadeira congeminando-se na bacia,
feita o sentar-se.
Ou flores bebendo a jarra.
O silêncio estrutural das flores.
E a mesa por baixo.
A sonhar.



* * *



Abrindo no escuro, durante toda a neve,
os copos, os vestidos, os mapas.
E dentro de mim, rompendo peixes,
uma noite sensível cor de martelos.
Esse grito, essa vírgula, esse amor, esse
martelo louco
nas borboletas. Então o meu cabelo
respirava — cabelo quente, telha
molhada.

Neve, borboleta, vírgula, estátua.





(Herberto Helder)

18 novembro, 2006