18 março, 2005

, eles sentam-se um de frente para o outro em alguma mesa exígua, em qualquer bar improvável da cidade, após uma longa hesitação só interrompida por abrupto besouro esvoaçando o campo de visão de ambos. uma moto corta a rua veloz e irritante. olho contra olho. corta. o garçom, solicitado, anota o módico pedido. corta. as xícaras ferventes se apóiam na mesa tremeluzindo na penugem dos braços impacientes. dedos tamborilando com serenidade. ambos não estão preocupados com o ritmo de suas respirações, exceto por uma ou outra entrecortada para dissipar a cresente perplexidade do momento tão esperado. uma breve mensagem, quase imperceptível, contorna os cabelos dela. as pálpebras dele se contraíam mínimas, ressentidas pela aproximação da escaldante xícara a cada gole ou pela distração da alça da blusa dela decaída pelo braço. corta. a mão apoiada no queixo não significava nada, um sinal irrisório, tanto ilusório, de como se pode interpretar qualquer gesto dela de acordo com sua vontade, a legítima queda. a realidade não diz nada, apenas solta e sugere, e ele cai em qualquer idéia que lhe apetece. é assim. ele nem desconfia da dança caleidoscópica da realidade neste piscar de pálpebras. ela, por sua vez, poderia pensar semelhante disparate, imaginando que nutriram um pelo outro melodias inexplicáveis e profundas, todas estas compartilhadas de forma insegura. combinaram que não diriam uma única palavra. não houve despedidas, nem reencontros. e foi assim até o sol dormir sobre as xícaras secas. vazias até a borra da eterna saudade,