(Diego Velásquez. saint john the evangelist on the island of patmos. 1618)
21
Não posso evocar o dia
Do meu nascimento, nem
Dizer quando morrerei.
Que homem saberá fazê-lo?
Vem, minha amada! À embriaguez
Quero pedir que me faça
Esquecer que neste mundo
Jamais saberemos nada.
59
Nenhum proveito trouxe ao universo o meu
Nascimento. Não o mudará na imensidade
Nem no esplendor a minha morte. Quem me explica
Por que vim a este mundo e hei de um dia ir-me embora?
90
Que possuo em verdade?
Que restará de mim
Depois de morto? É a vida
breve como um incêndio.
Chamas que o transeunte
Não tardará a esquecer,
Cinzas que o vento espalha,
Varre: um homem viveu.
134
Fatigado de interrogar
Em vão homens e livros, quis
interpelar a urna de vinho.
Pousei meus lábios nos seus lábios
E murmurei: "Quando eu morrer,
Para onde vou?" E ela: "Bebe.
Bebe em meus lábios longamente.
Nunca mais voltarás aqui."
88
Abre-te, meu irmão, a todos os perfumes,
Todas as músicas, todas as cores. Beija,
Afaga todas as mulheres, e repete
Que a vida é breve e serás pó na terra um dia.
90
Convicção e dúvida,
Verdade e erro são
Palavras vazias
Como a bolha de ar.
Irisada ou baça,
Essa bolha oca
é a imagem mesma
Da existência humana.
95
Não pedi para nascer.
Forcejo por aceitar,
Sem cólera nem espanto,
O que a vida me oferece.
E quando me for embora,
Partirei sem indagar
Explicação desta minha
Estranha estada na terra.
29
Os doutores e os sábios mais ilustres
Caminharam nas trevas da ignorância.
O que não impediu que em vida fossem
Tidos por luminares do seu tempo.
Que fizeram? Pronunciaram
Algumas frases confusas
E depois adormeceram
Para toda a eternidade.
77
Falam da estrada do Conhecimento...
Uns dizem tê-la achado, outros procuram-na
Mas um dia uma voz há de exclamar-lhes:
"Não há estrada nenhuma, nem vereda!"
76
Falam de um Criador... Terá formado
Então os seres só para destruí-los?
Por que são feios? Quem é o responsável?
Por que são belos? Não compreendo nada.
30
Pediu-me o coração: "Quero saber,
Quero instruir-me! Ensina-me, Khayyam,
Tu que durante a tua vida inteira
Tanto tens estudado e trabalhado!"
Disse a primeira letra do alfabeto,
E logo, pressuroso, o coração
Secundou: "Sei agora, um é o primeiro
Algarismo de um número sem fim."
112
Senhor, ó Senhor, responde-nos!
Deste-nos olhos, permitiste
Que a beleza das criaturas
Perturbasse os nossos sentidos.
Dotaste-nos da faculdade
De ser felizes, e pretendes
Todavia que renunciemos
A gozar dos bens deste mundo?
Mas isto é-nos mais impossível
Que virar, Senhor, uma taça
Para o chão, sem que se derrame
O líquido que ela contém.
56
A vida escoa-se...Que é feito
De Bagdad e Balk? O menor
Choque pode esfolhar a rosa
Demasiado desabrochada.
Por isso ouve este meu conselho:
Bebe vinho e contempla a lua
Lembrando as civilizações
Que ela viu desaparecerem.
83
Em que meditas, meu amigo?
Será nos teus antepassados?
Todos eles são pó no pó.
Meditas nas virtudes deles?
Repara só como sorrio.
Toma desta copa e bebamos,
Ouvindo sem inquietação
O grande silêncio do mundo.
81
No turbilhão da existência
Só são felizes aqueles
que sinceramente são sábios
ou não procuram instruir-se.
Fui inclinar-me sobre todos
Os segredos do Universo...
Voltei a casa invejando
Os cegos que eu encontrava.
14
Não anda firme em seu caminho
O homem que não colheu o fruto
Da verdade. Se conseguir,
Porém, da árvore da Ciência
Arrebatá-lo, saberá
Que passado e futuro em nada
Diferem daquele enganoso
Primeiro dia da Criação.
26
O vasto mundo: apenas
Grão de poeira no espaço.
Toda a ciência dos homens:
Só palavras, palavras.
Povos, animais, flores
Dos sete climas: sombras.
Resultado de toda
Tua meditação: nada.
38
Sono sobre a terra
Sono sob a terra.
Sobre e sob a terra
Corpos estendidos.
Nada em toda parte.
Deserto do nada.
Homens vêm chegando.
Outros vão partindo.
52
Se em teu coração
Enxertaste a rosa
Do Amor, tua vida
Não passou inútil.
Quer a voz de Deus
Ouvir procurasses,
Ou a taça brandisses
Sorrindo ao prazer.
150
Aprendi muito, esqueci muito
Também, e por vontade própria.
Em minha mente cada coisa
Estava sempre em seu lugar.
Não cheguei à paz senão quando
Tudo rejeitei com desprezo.
Compreendera enfim que é impossível
Tanto afirmar como negar.
(fragmentos do Rubaiyat, por Omar Khayyam. Nasceu em 1050. Morreu em 1123. Em Naishapur, Pérsia)
21
Não posso evocar o dia
Do meu nascimento, nem
Dizer quando morrerei.
Que homem saberá fazê-lo?
Vem, minha amada! À embriaguez
Quero pedir que me faça
Esquecer que neste mundo
Jamais saberemos nada.
59
Nenhum proveito trouxe ao universo o meu
Nascimento. Não o mudará na imensidade
Nem no esplendor a minha morte. Quem me explica
Por que vim a este mundo e hei de um dia ir-me embora?
90
Que possuo em verdade?
Que restará de mim
Depois de morto? É a vida
breve como um incêndio.
Chamas que o transeunte
Não tardará a esquecer,
Cinzas que o vento espalha,
Varre: um homem viveu.
134
Fatigado de interrogar
Em vão homens e livros, quis
interpelar a urna de vinho.
Pousei meus lábios nos seus lábios
E murmurei: "Quando eu morrer,
Para onde vou?" E ela: "Bebe.
Bebe em meus lábios longamente.
Nunca mais voltarás aqui."
88
Abre-te, meu irmão, a todos os perfumes,
Todas as músicas, todas as cores. Beija,
Afaga todas as mulheres, e repete
Que a vida é breve e serás pó na terra um dia.
90
Convicção e dúvida,
Verdade e erro são
Palavras vazias
Como a bolha de ar.
Irisada ou baça,
Essa bolha oca
é a imagem mesma
Da existência humana.
95
Não pedi para nascer.
Forcejo por aceitar,
Sem cólera nem espanto,
O que a vida me oferece.
E quando me for embora,
Partirei sem indagar
Explicação desta minha
Estranha estada na terra.
29
Os doutores e os sábios mais ilustres
Caminharam nas trevas da ignorância.
O que não impediu que em vida fossem
Tidos por luminares do seu tempo.
Que fizeram? Pronunciaram
Algumas frases confusas
E depois adormeceram
Para toda a eternidade.
77
Falam da estrada do Conhecimento...
Uns dizem tê-la achado, outros procuram-na
Mas um dia uma voz há de exclamar-lhes:
"Não há estrada nenhuma, nem vereda!"
76
Falam de um Criador... Terá formado
Então os seres só para destruí-los?
Por que são feios? Quem é o responsável?
Por que são belos? Não compreendo nada.
30
Pediu-me o coração: "Quero saber,
Quero instruir-me! Ensina-me, Khayyam,
Tu que durante a tua vida inteira
Tanto tens estudado e trabalhado!"
Disse a primeira letra do alfabeto,
E logo, pressuroso, o coração
Secundou: "Sei agora, um é o primeiro
Algarismo de um número sem fim."
112
Senhor, ó Senhor, responde-nos!
Deste-nos olhos, permitiste
Que a beleza das criaturas
Perturbasse os nossos sentidos.
Dotaste-nos da faculdade
De ser felizes, e pretendes
Todavia que renunciemos
A gozar dos bens deste mundo?
Mas isto é-nos mais impossível
Que virar, Senhor, uma taça
Para o chão, sem que se derrame
O líquido que ela contém.
56
A vida escoa-se...Que é feito
De Bagdad e Balk? O menor
Choque pode esfolhar a rosa
Demasiado desabrochada.
Por isso ouve este meu conselho:
Bebe vinho e contempla a lua
Lembrando as civilizações
Que ela viu desaparecerem.
83
Em que meditas, meu amigo?
Será nos teus antepassados?
Todos eles são pó no pó.
Meditas nas virtudes deles?
Repara só como sorrio.
Toma desta copa e bebamos,
Ouvindo sem inquietação
O grande silêncio do mundo.
81
No turbilhão da existência
Só são felizes aqueles
que sinceramente são sábios
ou não procuram instruir-se.
Fui inclinar-me sobre todos
Os segredos do Universo...
Voltei a casa invejando
Os cegos que eu encontrava.
14
Não anda firme em seu caminho
O homem que não colheu o fruto
Da verdade. Se conseguir,
Porém, da árvore da Ciência
Arrebatá-lo, saberá
Que passado e futuro em nada
Diferem daquele enganoso
Primeiro dia da Criação.
26
O vasto mundo: apenas
Grão de poeira no espaço.
Toda a ciência dos homens:
Só palavras, palavras.
Povos, animais, flores
Dos sete climas: sombras.
Resultado de toda
Tua meditação: nada.
38
Sono sobre a terra
Sono sob a terra.
Sobre e sob a terra
Corpos estendidos.
Nada em toda parte.
Deserto do nada.
Homens vêm chegando.
Outros vão partindo.
52
Se em teu coração
Enxertaste a rosa
Do Amor, tua vida
Não passou inútil.
Quer a voz de Deus
Ouvir procurasses,
Ou a taça brandisses
Sorrindo ao prazer.
150
Aprendi muito, esqueci muito
Também, e por vontade própria.
Em minha mente cada coisa
Estava sempre em seu lugar.
Não cheguei à paz senão quando
Tudo rejeitei com desprezo.
Compreendera enfim que é impossível
Tanto afirmar como negar.
(fragmentos do Rubaiyat, por Omar Khayyam. Nasceu em 1050. Morreu em 1123. Em Naishapur, Pérsia)
4 Comments:
tradução de manuel bandeira
abraçao, amigo
saudade, amigo.
marcar um dia e café.
abraço.
sentires plenos, define tudo.
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